*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo em 04/08/2012.
Há poucos dias, foi divulgado acordo firmado entre o Ministério Público Estadual e a Supervia, concessionária dos trens urbanos do Rio. A empresa fará obra para reduzir o vão entre o trem e a plataforma de embarque, na estação Triagem. Vamos entender: quando pára o trem na plataforma, fica “fresta” com inacreditáveis 80cm de largura, que os passageiros têm que pular.
A Supervia opera os serviços de trem urbano desde 1998. Por que esperou ação do MPE para fazer essa obra elementar?
Nesta semana, entrou em operação outro trem importado da China. Serão trinta até 2014, em uma frota de cento e sessenta. A concessionária diz que até 2016 todos serão novos ou reformados. Esse objetivo é passo importante para a recuperação do sistema.
No entanto, grande parte das estações está como em meados do século passado. As plataformas são descobertas, expostas ao sol e à chuva. Os acessos são por escadas com altura equivalente a três andares. Uma reforma dessa base física, para dar conforto ao usuário, não exige importação da China, basta haver projeto e decisão. Os recursos são ínfimos, se comparados com investimentos em rodovias.
A meta da Supervia é dobrar o número de viagens, chegar a um milhão/dia. O mesmo que há quarenta anos, quando a população era a metade de hoje. Pela abrangência da rede na metrópole, seria possível transportar mais de dois milhões de passageiros/dia. Por que não buscar essa meta? (O Rio é a cidade do país onde se gasta mais tempo na viagem casa-trabalho.)
Tal questão se insere no quadro de precariedade dos serviços públicos em nossas cidades. O saneamento na Baixada Fluminense chega à espantosa cifra de apenas 0,5% de esgoto tratado em Nova Iguaçu, que tem 800 mil habitantes. Também por isso, a despoluição da Baía de Guanabara pouco progride. O que explica que novos corredores de ônibus imponham aos passageiros usar escada e passarela para atravessar a rua que separa estação e calçada –ambas no mesmo nível? É o privilégio ao automóvel, que elimina sinais de trânsito em vias urbanas, apesar do corredor ser destinado ao serviço de transporte coletivo…
Nestas décadas em que o país passou de “eminentemente agrário” para “sexta economia”, nossas cidades foram maltratadas, subjugadas ao interesse de outras políticas setoriais. Acostumamo-nos à carência de investimentos em mobilidade, saneamento, habitação, à escassez de serviços públicos.
De fato, as cidades subsidiaram o desenvolvimento nacional.
Neste século 21, porém, as coisas mudam. O desenvolvimento se dará a partir do conhecimento e da inovação, cujo lugar é a cidade. Assim, o importante passivo sócio-ambiental urbano brasileiro se coloca como um desafio estratégico a ser enfrentado. Onde, também por exigência do avanço democrático, a universalização de bons serviços urbanos é condição indispensável.
Trazer os serviços públicos urbanos para a nossa contemporaneidade é obra coletiva, dos governos, da sociedade, de suas organizações. Não será coisa simples. Há de ser uma agenda de todos.