*Artigo publicado originalmente na revista Ciência Hoje 292 – Maio/2012
É plenamente reconhecido que as condições macro-estruturais do país e sua inserção internacional são muito positivas, desdobrando uma favorável perspectiva de desenvolvimento. Nesse processo, o sistema urbano tem papel fundamental.
São as cidades grandes, em especial as metrópoles, o lugar privilegiado do intercâmbio econômico mundial, das maiores oportunidades ligadas ao conhecimento, à pesquisa e à inovação. Hoje, 85% da população do país vive em cidades. Doze metrópoles alcançam 45% do Brasil urbano, enquanto as duas maiores, São Paulo e Rio de Janeiro, somadas, chegam a 20% da população urbana brasileira e se aproximam de 30% do PIB nacional.
O desenvolvimento nacional e o desenvolvimento urbano são interdependentes.
Mas, na última década, quando o Brasil construiu 13 milhões de domicílios, 40% deles foram construídos em favelas (“assentamentos sub-normais” na expressão do IBGE), dos quais 88% nas metrópoles.
Mas, na última década, quando o Brasil construiu 13 milhões de domicílios, 40% deles foram construídos em favelas (“assentamentos sub-normais” na expressão do IBGE), dos quais 88% nas metrópoles.
O cuidado com as cidades brasileiras tem sido muito aquém do necessário. Assim, ao ingressar no novo milênio, o Brasil urbano apresenta um elevado passivo ambiental.
A escassez de investimento no transporte coletivo de alto rendimento e a opção pelo transporte rodoviário, sobretudo o estímulo ao automóvel, leva o trânsito urbano à quase imobilidade. O Setor Transporte consome 26% do total das diversas fontes de energia do país, dos quais 96% no modo rodoviário. Nas 438 maiores cidades, 23% do consumo é com coletivos e 73% com automóveis, segundo Relatório da ANTP, 2011.
As águas urbanas estão poluídas, com apenas 48% dos domicílios tendo atendimento adequado de esgotamento sanitário. A gestão das cidades tem recebido pouco estudo e pequeno investimento. Exemplifica-se com o caso das cidades metropolitanas, que não dispõem de estatuto próprio. Neste panorama, a prestação dos serviços públicos é escassa e mal distribuída. Entre os com grande carência, ressalta-se o da segurança pública. Os altos índices de violência urbana nas principais cidades está alcançando, já agora, as cidades médias.
O enfrentamento desse passivo socio-ambiental-urbanístico se coloca, francamente, como uma das condições para o desenvolvimento nacional.
Nosso país foi capaz de construir um novo patamar político e econômico em pouco mais de duas décadas, com ampliação dos direitos e garantias cidadãs juntamente com o crescimento da economia. A incorporação econômica dos estratos mais pobres da população se apresenta como uma possibilidade demonstrada, não é apenas um desejo.
Simetricamente, no âmbito urbano, essa conquista deverá corresponder à busca pela equidade no acesso e usufruto da cidade. Ou seja, um processo de políticas públicas que objetive a universalização na prestação dos serviços públicos; que reconheça as preexistências ambientais e culturais construídas pela população, onde o acesso à moradia adequada precisará ser contemplado como um direito cidadão; que considere a mobilidade urbana como uma conquista social e um fator de promoção do desenvolvimento; enfim, que encaminhe a cidade na direção da sustentabilidade ambiental e social.
A questão urbana é pouco assídua no debate nacional, não obstante esse quadro de possibilidades e de carências enfrentado pelas cidades brasileiras. Mesmo por ocasião de eleições gerais, discute-se quase nada sobre a cidade, sugerindo uma baixa conscientização da sociedade sobre as consequências negativas desse alheamento para o bem estar geral.
Mas o sistema urbano brasileiro precisa ser tratado na sua dimensão estratégica para o desenvolvimento socio-economico do país.
A democracia veio para ficar. As cidades precisarão corresponder a esta dimensão política.