Lucas Franco
Na abertura da exposição sobre o arquiteto Affonso Eduardo Reidy, realizada no Centro de Arquitetura e Urbanismo em Botafogo, o arquiteto e professor Roberto Segre fez um belo discurso em defesa do CAU e da arquitetura carioca.
A seguir, um trecho selecionado e ao final, o link para o discurso completo.
“(…) A presença de Maria Helena na atual direção do CAU demonstra o desejo de valorizar-lo, e continuar com os sucessos da época gloriosa, no período em que Conde era, primeiro Secretário de Urbanismo, e posteriormente Prefeito, e renovar o trabalho editorial com a publicação de livros significativos para a cultura arquitetônica e urbanística do Rio de Janeiro, como já foi a recente edição de análise do Plano Agache, e que está se aprontando sobre o plano Doxiadis. Mas pode se afirmar que aquele momento de esplendor está voltando?. Temos essa dúvida. Naqueles anos, Conde, arquiteto de renome, dedicou-se á política e a gestão pública, não para fazer política, mas com o objetivo de melhorar o nível da arquitetura e do urbanismo da cidade, e valorizar os conteúdos estéticos e culturais do ambiente construído. E podemos afirmar que os programas de Rio Cidade e Favela Bairro, com a participação de Sérgio Magalhães, foram sem dúvida a continuidade dos sonhos, dos ideais, das aspirações de Reidy, naquela sua utopia que imaginava com os arquitetos de talento deviam trabalhar como funcionários públicos para desenvolver as iniciativas construtivas do estado, sempre concretizadas com obras de alto valor estético.
Daí que a proposta de criar o CAU se originava no desejo de ter um centro cultural da arquitetura que permitisse á população da cidade, conhecer, participar, informar-se e integrar-se no conhecimento, no prazer, na alegria de compreender e compartilhar a presença da boa arquitetura, da sua beleza, na vida cotidiana. A aspiração era que o CAU devia ter um apelo e uma popularidade semelhante aos que difundem a significação das artes plásticas, como o Centro Cultural Banco do Brasil, ao dos Correios ou da Caixa Econômica. E que esta responsabilidade devia ser uma tarefa da Prefeitura, cujos recursos ajudariam a elevar o nível cultural da população carioca, e motivar o interesse pela arquitetura. Considerando também que o IAB, também responsável por esta missão, nunca teve recursos próprios devido a miopia dos arquitetos membros, que não contribuem economicamente com o seu desenvolvimento. Objetivo de grande significação social, em um contexto em que a maioria das pessoas, e em particular da classe média, estão alheios aos valores culturais da arquitetura, e se emocionam com a banalidade dos prédios dos condomínios fechados da Barra, se entusiasmam com os shopping centers e desprezam a maravilhosa herança contida no centro do Rio de Janeiro.
Com a importância dos grandes eventos que estão previstos no Rio para os próximos anos – o mundial de futebol e as olimpíadas – , é urgente desenvolver na população o conhecimento e a informação do que se pretende fazer, dos projetos que serão construídos, da participação dos profissionais locais e estrangeiros, e qual é o debate sobre as transformações urbanísticas previstas e as opções possíveis, entre a proposta de seguir expandindo a Barra o revitalizar o abandonado centro da cidade. E por isso, já que o Brasil é um país democrático ainda, e pode se falar com total liberdade, e não cair no infantilismo esquerdista de banir as opiniões adversas aos interesses dos políticos de turno, me permito fazer a crítica que considero um absurdo o enfraquecimento do CAU, a sua redução a este espaço mínimo onde estamos reunidos esta noite, onde praticamente, a exposição é reduzida a estas poucas paredes, apresentada sem recursos, na vez de ocupar todas as salas originais do centro, como mereceria uma grande homenagem a Reidy, e que não é possível porque grande parte do CAU foi ocupada por escritórios administrativos da Prefeitura.
E considero que é um grande erro dos políticos atuais, acreditar que não é importante a cultura arquitetônica da nossa sociedade. E que a visibilidade da arquitetura seria somente atingida através da presença de obras do jet set internacional, espalhando “elefantes brancos” na cidade. Admiro as obras projetadas por Jean Nouvel, Christian de Portzamparc, Diller & Scofidio e Santiago Calatrava, que irão integrar Rio no “efeito Bilbao” para atrair investimentos e turistas, mas admiro mais as iniciativas desenvolvidas por Conde e Magalhães, que convidaram os melhores arquitetos cariocas a desenvolver projetos criativos que se espalharam nos quatro cantos da cidade, atingindo com boa arquitetura os bairros e as populações pobres e distantes, com esse conteúdo social que tanto preocupava ao Reidy. E hoje, depois da tragédia que aconteceu no Rio na segunda 05, a população pode se perguntar, quais são os projetos que a Prefeitura tem para estes casos de emergência?. Quais são as propostas dos arquitetos para resolver os graves problemas das moradias nas áreas de risco?. Que vai ser feito no futuro para evitar as enchentes, como em Niterói, onde a especulação imobiliária é a dona da cidade, e não tem desenvolvido nenhuma obra de infra-estrutura que acompanhe o crescimento exagerado de prédios de apartamentos de luxo?. (…)”
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