Temos o que comemorar. Encerrada com sucesso a conferência do clima, em Paris, os países signatários precisarão traçar políticas e planos que correspondam aos compromissos assumidos.
Nosso país sempre foi avesso a pensar no médio e no longo prazos. Acostumamo-nos a deixar tudo para a última hora. Mas, neste caso, se postergarmos as providências necessárias, o prejuízo nos resultados será inevitável. Assim, podemos ter a esperança de que, forçado pelo acordo internacional, inaugura-se um novo tempo para o Brasil?
Certamente, o território brasileiro, nas diversas escalas – desde a nacional até à local – precisará ser tratado de modo novo. Mas o percurso não será fácil.
Basta constatar que, nem bem decorrida uma semana do histórico acordo de Paris na COP 21, no contrapelo dos compromissos assumidos pelo país, nossa ministra da Agricultura justifica o desmatamento brasileiro nos seguintes termos: “Que bom seria se pudéssemos produzir tudo sem desmatar uma árvore. (…) Temos que assumir, porém, que desmatamos não foi para deixar áreas ao vento e ao léu; foi para fazer uma das mais produtivas agriculturas do mundo.” (FSP, 15/12/15)
Esse pensamento certamente está em sintonia com o “produtivismo” da empresa Samarco, um dos responsáveis pela tragédia de Mariana – ainda não claramente dimensionada. Mas não está em sintonia com o tempo.
Em busca de resultados, sem suficientemente avaliar os meios e suas consequências, o país construiu um importante sistema urbano onde moram quase duzentos milhões de pessoas. É um sistema que inclui vinte metrópoles e duas megacidades – um gigantesco patrimônio. Mas, também é verdade que aí se encontra um passivo sócio-ambiental muitíssimo elevado, de grandes desigualdades e em que metade dos domicílios urbanos não tem esgoto adequado – comprometendo a saúde da população e a vida de nossos cursos d’água.
Foi também nesse panorama que, apesar das enormes dificuldades no quotidiano de mobilidade de milhões de brasileiros, nosso governo optou por ampliar o estímulo à produção de automóveis, altamente consumidora de combustíveis fósseis e degradadora do ambiente urbano, ao invés de estimular o transporte coletivo, sobretudo o de alta capacidade, tipo metrô – não poluente, muito mais eficaz e socialmente mais justo.
A democracia exige uma outra atitude. Não é mais aceitável o padrão de irresponsabilidade em que, parece, nos acostumamos.
O Brasil precisa readequar-se desde a escala local até à escala nacional. Todo o seu imenso território precisa ser objeto de cuidadoso trabalho de planejamento e de projeto. Seja para a produção de energia, para a logística da produção, para a preservação das riquezas ambientais, para o bem-estar da sua população, o desenho do território brasileiro, em todas as escalas, é um instrumento indispensável. Através do desenho se faz melhor a análise de possibilidades e a definição das melhores propostas. As políticas públicas não devem ser traçadas apenas por artigos e parágrafos descontextualizados: precisam ser espacializadas – para que sejam convenientemente avaliadas e, sendo aprovadas, possam buscar os melhores resultados.
O planejamento e o projeto do território, dos espaços regionais, dos espaços metropolitanos e dos espaços urbanos precisam ser formulados permanentemente como função de Estado. É o modo mais consequente para adentrarmos o novo século em correspondência com os desejos da nossa época. E com os compromissos que a Humanidade exige – e que o Brasil adotou.
Acho que, sim, podemos ter esperança. É longo o caminho. Mas é bonito, é promissor.
Artigo para Cidade Inteira/Ciência Hoje dez 15