O Globo jul 16
O prefeito do Rio diz que a Olimpíada é uma oportunidade perdida pelo país. Às vésperas dos Jogos, o governador declara estado de calamidade em pleno sol. Onde ficarão na Abertura as autoridades federais, qual que sai, qual que fica?
Estarão os políticos à beira de um ataque de nervos? É caso para Pedro Almodóvar? Não obstante, somos esperançosos: a Olimpíada será um sucesso e a cidade estará vibrante e receptiva. (Rezamos os crentes e torcemos os dedos os demais.)
Contudo, vencida a etapa, desanuviado o cenário nacional, precisaremos refletir sobre novos rumos. Já não digo os do país, cujo decifração é troppo para vís mortais, mas os meros rumos do Rio. Há cinquenta e seis anos da saída da capital, há quarenta da fusão, é tempo de uma revisão. O modelo que nos trouxe até aqui esgotou.
A insolvência do governo surpreende porque o Rio de Janeiro é estado rico. Entre os estados brasileiros, é o mais urbano e de maior densidade demográfica, de maior “densidade econômica” (relação PIB/Território) e maior “densidade orçamentária” (tem o dobro de Orçamento que São Paulo por território a cuidar: R$ 1,8 milhões/km2, no RJ; e R$ 0,8 milhões/km2, em SP, segundo dados de 2015.)
Ora, se o RJ é denso em população, em renda e em orçamento, por que indicadores relacionados ao território, como estradas, mobilidade, saneamento e segurança, são o que são?
Ademais, o Rio é uma das grandes cidades mundiais e a concentração de 75% da população do estado na região metropolitana é excepcional fator potencializador de investimentos e infraestrutura.
As dificuldades do estado do Rio não são coisa do outro mundo.
Veja-se a mobilidade olimpica. Segundo a jornalista Selma Schimit, no Globo, a maior demanda de público será para os jogos que se realizarão no eixo olímpico Deodoro-Engenhão-Maracanã-Sambódromo. Esse eixo é servido pela Central do Brasil, concedida à Supervia, responsabilidade do governo do estado. Quanto foi investido nessa linha, que passa por 24 bairros? As 22 estações foram recuperadas? São acessíveis? Os usuários estão protegidos do sol e da chuva?
O estado gastou oito bilhões de reais na extensão da Linha 1 do metrô, Ipanema-Jardim Oceânico, de baixa participação olímpica e alto custo por passageiro. De fato, será um metrô singular: uma linha (e três nomes). Por um valor ínfimo do dispendido (talvez nem dez por cento), o estado traria à contemporaneidade o eixo da Central, com estações confortáveis e trens circulando em intervalos pequenos, tal metrô das grandes cidades. E, agora, o público olímpico e os moradores do Rio estariam melhor atendidos.
Não se chora o leite derramado. Mas é preciso reconhecer que o estado gasta mal, muito; e bem, pouco. Não tem serviços de planejamento compatíveis com sua responsabilidade.
Dizem os estudiosos que é indispensável um novo marco político e um amplo acordo social. Como se faz? Quem os propõe?
O mesmo governo que estendeu o pires, se quiser, tem tempo de previnir outras calamidades. Quem acredita no valor da qualidade do espaço para o bem estar das pessoas, diria que o começo pode ser a constituição de estruturas permanentes de Planejamento como função de Estado, tanto no âmbito estadual quanto dos municípios, de modo que estudos sérios possam embasar a ampla reflexão da sociedade e fundamentar investimentos futuros (que virão), sejam públicos ou concedidos. Custa pouco e poupa muito. É ainda uma boa medida para evitar o ataque de nervos de nossos políticos – e de nós todos.
O Rio de Janeiro pode ser uma unidade federada exemplar – ainda tem recursos econômicos e humanos para tanto. (Digo ainda tem porque eles se esgotam em ambiente desfavorável.) Porém é preciso mudar de rumo.
Mas tudo isso pode ficar para depois. Agora, é torcer pela Olimpíada, pelo Rio e pelo Brasil. Bons Jogos!