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O Globo

Monumentos ao absurdo

By 08/12/2012setembro 23rd, 20215 Comments
*Artigo publicado originalmente no jornal O Globo de 08/12/2012
 
Por que obras públicas essenciais são postergadas e supérfluas são implantadas com sofreguidão? Por que a cada hora surgem saídas modernosas de metrô, passarelas monumentosas, píers em Y, entre outras intervenções que comprometem a imagem ambiental de nossas cidades? Por que planejar Brasília a partir de Cingapura –uma ideia de jerico?
Nestas últimas décadas, o desenvolvimento socioeconômico do país está sendo feito com o fortalecimento de suas instituições, agora democráticas, e com grande interesse e participação da sociedade. Porém, não é o mesmo o que ocorre no caso urbano. Aqui, há uma clara des-institucionalização da ideia de planejamento, de projeto e de prioridade.
Com o espetacular crescimento ao longo do século XX, nossas cidades se tornaram muito complexas. Ficou difícil ao cidadão compreender a escala de uma grande cidade. Questões que interferem diretamente na vida das pessoas, como a mobilidade, o saneamento e a segurança, se apresentam tão embaralhadas que ao senso comum parecem insolúveis.
Não são insolúveis, porém. Há respostas adequadas ao tamanho da grande cidade, mas, certamente, não serão imediatas, ao alcance de um desejo. É preciso estudar, planejar, projetar; é preciso tempo e continuidade na decisão. É preciso debater. Não há varinha de condão que substitua processo continuado de enfrentamento de cada questão.
Contudo, há de se reconhecer que muitas cidades desconstruíram seus incipientes organismos de planejamento, seja urbano ou metropolitano, como se deu no Rio. Instituições de pesquisa e estudos urbanos, sem renovação, são relegadas à burocracia ou extintas.
Assim, as cidades continuam a implementar respostas já superadas, como os investimentos que privilegiam o transporte rodoviário –embora já se saiba que a mobilidade não melhora com mais pistas. Sem planos, a interlocução com o mercado imobiliário assume papel hegemônico nos órgãos urbanísticos e de controle das principais cidades brasileiras –mas a maior parte das moradias é construída à margem da regulação.  Sem projetos –tudo é emergencial. Tudo assume caráter prioritário, inclusive as obras supérfluas e de custo exagerado.
Construir a cidade do século XXI é enfrentar o passivo ambiental, sanear os rios, universalizar os serviços públicos, inclusive o de segurança, conter a expansão especulativa da área ocupada, qualificar o espaço público.
Mas será preciso construir instituições urbanísticas e de planejamento estáveis, que sejam consideradas para além dos governos, abertas ao diálogo com a sociedade. Dá trabalho e reduz o poder discricionário dos governantes –mas melhorará os seus governos. Certamente, evitará arroubos modernosos, monumentosos –ou atentados, como o caso Brasília by Cingapura. Como desconhecer que a cultura não é objeto supérfluo, mas elemento central da soberania de um povo?
A democracia política veio para ficar. Ela há de conduzir à democratização das cidades. Não custa dar uma ajudinha.