Eduardo Cotrim
Tudo que ligue dois pontos de modo mais eficiente é fundamental, mas é sabido que a eficiência da ligação não significa sempre o melhor percurso aparente.
A ponte Rio-Niterói, por exemplo, poderia ser reduzida a quase um terço de sua extensão, se saísse das proximidades do Santos Dumont e chegasse do outro lado da baía, no bairro do Gragoatá. Houve certamente motivos na época, embora de fato os desconheça, para ter sido erguida onde foi. Nesse caso, a eficiência existiu, presume-se, embora não tenha coincidido com o melhor percurso aparente.
O próprio Santos Dumont já foi exemplo de ligação eficiente, mas de menor trajeto. Atravessava-se o pilotis, tomava-se um café e entrava-se direto na pista para pegar o avião, a poucos metros da calçada. O anexo que foi construído quebrou essa lógica.
Mas para além da eficiência, há outro aspecto, a relevância. Como eficiência e relevância não deveriam ser coisas desconexas, mas são, no sentido de que basta uma delas para se construir alguma coisa, sendo que pode-se ainda construir alguma coisa sem nenhuma delas, importa haver equilíbrio entre os dois aspectos.
É o que se espera no Rio, dos quatro grandes projetos de ligação entre bairros, que no momento estão sobre a mesa: Ipanema – Barra da Tijuca, Deodoro – Barra da Tijuca, Aeroporto – Barra da Tijuca e Santa Cruz – Barra da Tijuca. A primeira, via Metrô, as demais por corredores expressos.
Sem números e estatísticas, não se põe em dúvida a sinceridade no entendimento de que esses sejam os investimentos mais relevantes em transportes para os Jogos e para o Rio, como legado.
Fato é que a Barra sediará uma parte importante das Olimpíadas e está numa área distante do Centro, da Zona Norte, da Zona Sul e mesmo da Zona Oeste, o que faz com que os investimentos em transportes se revistam de maior sentido.
No entanto, há outras ligações nada eficientes e bem mais relevantes.
Evidente, se fosse possível hoje executar ao mesmo tempo conexões rápidas entre todos os bairros da cidade, nenhuma delas seria mais relevante que as outras. Mas não é o caso, não há recursos para todas, o que torna a relevância de uma relativa à de outras.
Os trajetos até hoje mais populosos, os do Centro – bairros da Zona Norte, são culturalmente relevantes e historicamente conturbados, embora o Centro e a Zona Norte sejam o espírito da cidade. Não é questão de bairrismos – o que o carioca e sua cultura produziram para o país e para o mundo não teve tempo de vir da Barra da Tijuca. Mas não se trata de implicar com os BRTs Rio – Barra da Tijuca, já consumados. Trata-se de aproveitar a oportunidade e também olhar a cidade nos trajetos dos maiores deslocamentos e de suas raízes.
A cultura carioca para todos é a dos nascidos e moradores da Zona Norte, Chiquinha Gonzaga, Lima Barreto, Cecília Meireles, Nelson Cavaquinho, Almirante, Noel Rosa, Ataulfo Alves, Moreira da Silva, Nelson Rodrigues, Tom Jobim e os que fizeram as fundações da ponte Rio-Niterói, o pilotis do Santos Dumont… e a dos nascidos e moradores do Centro e arredores, Machado de Assis, Ernesto Nazareth, as filhas do presidente Afonso Penna, mães do carnaval de rua carioca, Villa-Lobos, Di Cavalcanti, Pixinguinha, Ismael Silva, fundador da primeira escola de samba no Estácio, Cartola, Carmem Miranda.
O Centro do Rio e seu patrimônio há muito decaem. Do Paço Imperial ao Largo de São Francisco, da Ouvidor à Praça da República. Algo a ser pensado. Não para os Jogos, para nós – a Zona Norte, com tamanho crédito com a cidade pede socorro aos bons meios de transportes.
Retoma-se a sugestão mais do que cantada pelo(a) Cidade Inteira, como justiça à história do Rio: a conexão Centro – bairros da Zona Norte. Com vagões rápidos, pontuais, ar condicionado, estações decentes, facilmente acessíveis.
E salve Estácio, Salgueiro, Mangueira, Osvaldo Cruz e Matriz…