Quanto mais os defensores proclamam que o objetivo dos muros em favelas da Zona Sul é evitar o desmatamento, mais me reforça a convicção de que há um objetivo oculto, maior do que esse proclamado: sinalizar que o governo está atuante.Mas por que o governo precisa dessa sinalização?
Como o governo –por razões que se somam- não consegue impor uma política de retomada de territórios e permanência do Estado nas áreas dominadas pelos traficantes ou por milícias, passa a apelar para a comunicação indireta. Os muros são apenas isso.
Não fossem, as soluções lembradas pelo arquiteto Janot, no Globo, teriam sido consideradas antes do anúncio dos muros. São propostas de bom senso, que fazem parte do repertório de limitação reconhecido e utilizado em inúmeras situações. Outros articulistas também se manifestaram assim, como o fez Elio Gaspari.
Ademais, não podemos deixar de considerar que os muros se apresentaram a reboque das batalhas entre bandidos que ocorreram na Ladeira dos Tabajaras, com repercussão na Fonte da Saudade e adjacências, e reflexos, a seguir, na Rocinha.Nesse sentido, os muros também atuariam como uma ação diversionista, útil para substituir o impacto negativo das semanas precedentes.
No entanto, na polêmica, fica evidente uma questão que me parece muito grave.
Trata-se de um movimento que conduz ao retorno da estigmatização da favela, sobretudo as da Zona Sul, como lugar pernicioso à vida civilizada.
Ora, isso é de um simplismo absurdo; sobretudo, é uma enorme injustiça.
O Rio de Janeiro está se esboroando sob uma crise urbana de décadas –e passa a atribuir seus problemas aos seus pobres.
Mas é o Estado brasileiro, perfeitamente apropriado pelas elites políticas, econômicas e sociais, que tem se mostrado incapaz de proteger centenas de milhares de cidadãos que estão sob jugo da bandidagem, não apenas em sua integridade física, mas também nas relações econômicas, políticas e sociais do quotidiano. O Estado é ou omisso ou inoperante. De qualquer modo, é incapaz de se fazer valer em imensos territórios metropolitanos, cada vez mais disponíveis para a implantação das leis autoritárias dos grupos armados, gangues e milícias.
Precisamos de um Movimento pela Constitucionalização!
Queremos a Constituição brasileira vigorando plenamente em toda a Cidade!
É daí que poderemos esperar a redução da violência e o enfrentamento da crise urbana.