O Globo 14 07 18
Em exatos dois anos, julho de 2020, o Brasil sediará o maior evento da arquitetura, o Congresso Mundial de Arquitetos, no Rio de Janeiro. Por tal condição, a cidade poderá ser designada pela Unesco como Capital Mundial da Arquitetura.
A arquitetura é o edifício e a cidade. É todo espaço construído.
Se ao longo da história a arquitetura privilegiou o edifício especial, a ponto de pensadores do século XIX criarem a disciplina “urbanismo” para enfrentar os desafios da cidade que crescia exponencialmente, com o Movimento Moderno, doutrina arquitetônica do início do século XX, a arquitetura voltou-se para o conjunto construído. Engloba, hoje, as edificações, não apenas as especiais, também as comuns, e o urbano – tudo que constitui espaço de vivência. Arquitetura é o projeto e a obra, o planejamento, a tecnologia, o objeto e o sistema, a metrópole, o asfalto e a favela.
Esse, portanto, é o campo de interesse dos congressos mundiais.
Sociedades avançadas, como a França, têm a arquitetura como constituinte da sua identidade nacional – e lhes fazem corresponder instituições que a valorizem. Prédios públicos e ações urbanísticas são feitos através de concurso de projeto para escolha da melhor solução.
No Reino Unido, arquitetos distinguidos, como Richard Rogers, tornado Barão de Riverside, e Norman Foster, feito Barão do Tâmisa, integram a Câmara dos Lordes. Na Itália, Renzo Piano foi nomeado senador vitalício.
Portugal é exemplar. Tanto a obra de grandes mestres, como Siza Vieira e Souto Moura, ambos premiados com o Pritzker, equivalente ao Nobel, como a obra comum, são produzidas com grande esmero e simplicidade. A qualidade das cidades atesta esse cuidado.
Um bom espaço não é fruto do acaso. Resulta de boas ideias, boas obras, trato constante. A complexidade da cidade pede instituições permanentes para o estudo, o planejamento, a gestão das obras, a manutenção. A boa cidade é construída no tempo – e é condição para o desenvolvimento. Não nos iludamos: a redução da violência será sustentável quando os governos estiverem presentes em todo o território, com serviços públicos universalizados.
Infelizmente, nossas instituições voltadas para o tema são deficientes. O ministério das Cidades não disse a que veio. Sua obra principal, o Minha Casa Minha Vida, é um desastre. Para enfrentar os desafios precisaremos construir uma agenda consensuada entre agentes públicos e privados que objetive trazer a cidade brasileira para o século XXI. A tarefa não é trivial. Mas é indispensável.
É assim que o Instituto de Arquitetos do Brasil, IAB, com apoio das instituições profissionais da arquitetura, fundamentou a conquista para organizar o Congresso Mundial no país. Ressalte-se, o evento é promoção da União Internacional de Arquitetos, UIA, e ocorre a cada três anos. O último na América Latina foi há 42 anos; será o primeiro no Brasil.
Com dezenas de milhares de arquitetos de todo o mundo, e Comitê de Honra presidido por Paulo Mendes da Rocha, nosso Pritzker, não pode ser só de arquitetos.
Deseja-se amplo diálogo com a sociedade. Pede-se o apoio e a participação da cultura, da academia, das empresas, de projeto e construção, corporações,
movimentos sociais, mídia, política – em sinergia com as experiências internacionais.
Outros encontros como a XIIª Bienal Internacional de Arquitetura, em São Paulo, e o XXIº Congresso Brasileiro de Arquitetos, em Porto Alegre, ambos em 2019, serão significativos para a estruturação do debate mundial a ser desenvolvido no Rio.
Ademais, neste janeiro, a UIA e a Unesco firmaram acordo pelo qual este órgão da ONU poderia designar as cidades-sedes dos congressos mundiais como “capital mundial da arquitetura”. É um selo importante, que pode ampliar a potência dos congressos. Assim, a Prefeitura do Rio e o IAB propuseram em conjunto uma programação para 2020 que foi aprovada pelo Conselho da UIA, em maio, e aguarda possível designação pela Unesco.
“Todos os Mundos, Um só Mundo, Arquitetura 21” é o tema do 27º Congresso Mundial de Arquitetos UIA 2020 RIO. Ele encerra o desejo de compreensão da multiplicidade de culturas de nossa contemporaneidade, da diversidade espacial, do edifício ímpar à favela, do direito à cidade, ao tempo de seu compromisso solidário com um mundo que é único e de todos.
Que o Brasil e o Rio possam ser úteis para a construção de um mundo melhor – expressão da arquitetura que se deseja para este nosso século.