Ciência Hoje – Dez 2012
Todos reconhecemos que o desenvolvimento socioeconômico do país está sendo feito com o fortalecimento de suas instituições, agora democráticas. O crescente interesse de participação da sociedade é uma evidência. Porém, não é o mesmo o que ocorre no caso urbano. Aqui, parece haver certa des-institucionalização.
Com o espetacular crescimento que experimentaram no século XX, nossas cidades se tornaram muito complexas. Ficou difícil ao cidadão compreender a escala de uma grande cidade. Questões que interferem diretamente na vida das pessoas, como a mobilidade, o saneamento e a segurança, se apresentam tão embaralhadas que ao senso comum parecem insolúveis.
Todavia, não são insolúveis. Haverá respostas adequadas à grande cidade, mas, por certo, não serão imediatas, ao alcance de um desejo. É preciso estudar, planejar, projetar; é preciso tempo e continuidade na decisão. É preciso debater. Não há varinha de condão que substitua processo continuado de enfrentamento de cada questão.
Contudo, há de se reconhecer que, no geral, o sistema urbano brasileiro desconstruiu os incipientes organismos de planejamento que tinham sido timidamente implantados a partir da década de 1950. As poucas instituições de pesquisa e estudos urbanos, sem renovação, foram relegadas à burocracia ou extintas.
Assim, as cidades persistem em implementar respostas já superadas, tais como os investimentos que privilegiam o transporte rodoviário –embora já se saiba que a mobilidade urbana não melhora com mais pistas. (Mais pistas, mais engarrafamentos.) Sem planos, a interlocução com o mercado imobiliário assume papel hegemônico nos órgãos urbanísticos e de controle das principais cidades brasileiras, enquanto a maior parte das moradias urbanas é construída à margem da regulação. Sem projetos –tudo é emergencial. Tudo assume caráter prioritário, inclusive as obras supérfluas e de custo exagerado.
Para a construção da cidade do século XXI será preciso enfrentar o gigantesco passivo sócio-ambiental resultante das décadas de acelerado crescimento demográfico. Nesse passivo se inclui a escassez na prestação dos serviços públicos, cuja meta de universalização precisa vir a compor nossa agenda política. Certamente, para isso, precisaremos conter a expansão especulativa da área ocupada e qualificar o espaço público.
Mas essas metas não se farão sem a construção de instituições urbanísticas e de planejamento estáveis, que sejam consideradas para além dos governos, abertas ao diálogo com a sociedade. Dá trabalho e reduz o poder discricionário dos governantes –mas melhorará os governos. Sem dúvida, evitará o desperdício e os investimentos desastrados que tem sido uma característica de nossas cidades, em um vale-tudo urbano que vira as costas ao cidadão.
A democracia política veio para ficar. Ela há de conduzir à democratização das cidades. Mas não custa dar uma ajudinha.